‘Mercado de Carbono é uma nova moeda e setor produtivo de biocombustível tem que estar preparado’ afirma especialista na área durante evento na Asplan

“O Renovabio valoriza a eficiência e a eficiência de produção significa eficiência de custo e tem um viés ambiental que é extremamente importante porque hoje isso não é uma questão de marketing, mas de mercado de carbono que é uma nova moeda que a gente tem disponível e vai gerar muitos recursos para o setor produtivo que estiver preparado para saber lidar com essa situação”. Foi com essa afirmativa que o Chefe Geral da área de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Meio Ambiente, Marcelo Morandi, abriu sua fala durante um encontro, em João Pessoa, na quarta-feira (06). O evento foi promovido pelo Sindicato da Indústria de Fabricação de Álcool no Estado da Paraíba (Sindalcool), com apoio da Associação dos Plantadores de Cana da Paraíba (Asplan)  aconteceu no auditório da Associação.

Segundo explicou Marcelo Morandi, o Renovabio é uma política que estabiliza o mercado, que valoriza a eficiência de produção, não é uma certificação ou um processo simplesmente para ganhar um selo e também não muda o mercado físico de Etanol. “Com o Renovabio o mercado continua tendo o produtor de cana, a usina, o fornecedor, o distribuidor de etanol, os postos, o consumidor. O que nós criamos com o programa é a possibilidade de ter um outro mecanismo de renda neste processo todo. Quem estiver preparado e entrar neste mercado vai continuar produzindo e comercializando o etanol, mas com a vantagem de gerar um outro ativo financeiro que é o crédito de carbono”, disse ele.

O crédito de carbono, segundo o especialista, está muito relacionado à confiabilidade do sistema de produção. “É isso que permite que o Renovabio tenha um potencial de, de fato, fazer a diferença não só no mercado interno, mas ter uma influência no mercado externo, no sentido de mostrar que esse mercado de carbono é eficiente e real. Para isso era preciso ter uma metodologia de medir isso para poder gerar esse crédito de descarbonização”, afirmou Marcelo.

Esse crédito de descarbonização, segundo o representante da Embrapa,  é aferido a partir de uma metodologia denominada ‘Análise do Ciclo de Vida’, que faz uma contabilidade ambiental de todo o processo de produção, ou seja, contabiliza tudo do berço a roda, comparando desde a extração do petróleo para gerar a gasolina ou o óleo diesel, até quando ele é colocado no tanque do veículo e queimado, como desde a produção dos insumos que  serão usados para plantar cana, fertilizantes, insumos, etc, até que esse etanol vá para o tanque do carro e seja queimado. Esse comparativo é basicamente o que a Renovacalc faz.

A calculadora denominada Renovacalc é quem vai medir e contabilizar tudo, a partir de um conjunto de parâmetros que são importantes e vão influenciar a nota da empresa com capacidade de produção de um biocombustível com menor capacidade de efeito estufa, seja ele produtor ou usina. Ambos, de acordo com a explanação de Marcelo, terão acesso e conseguirão fornecer as informações para efeito de cálculo de eficiência. “A calculadora é um processo de contabilidade ambiental que calcula a nota de eficiência do processo. Para mostrar que meu processo é eficiente, eu tenho que ter a organização das informações. Esse é um ponto importantíssimo do Renovabio porque ele traz a possibilidade dos produtores também se familiarizarem no sentido de ter um maior controle de seu processo de produção, seja ele usina ou fornecedor de cana. Esse é um ganho que esse processo traz”, explicou a Dra. Nilza Patricia Ramos, pesquisadora da Emrapa, que junto com Marcelo participou do encontro, em João Pessoa, que reuniu produtores de cana, industriais e pesquisadores de universidades.

O modelo do Renovabio, segundo os expositores do encontro, tem um diferencial comparado, por exemplo, ao adotado na Califórnia (EUA). “No modelo americano, há faixas que igualam todo mundo. Aqui, no Brasil, a forma como foi feito e a existência da Renovacalc permite que o produtor descreva seu processo e faça a contabilidade de seu sistema produtivo de forma individual e assim identificar onde ele pode intervir para melhorar seu sistema e, consequentemente, melhorar sua nota para obtenção dos créditos de Carbono”, lembrou a Dra. Nilza.

Eles explicaram também que a emissão de CO² do combustível fóssil está muito concentrada na queima do motor, porque a extração do petróleo, o refino e a distribuição tem uma emissão de particulados relativamente menor. A grande emissão está na queima dele. O biocombustível é o contrário, pois na queima do veículo a emissão é pequena, a emissão maior está no processo de produção, desde a fase agrícola até a industrial, principalmente, na fase agrícola. E um fator importantíssimo no processo de emissão de gases do efeito estufa pelo biocombustível é a mudança de uso da terra, ou seja, o processo de uso do solo, é onde está a grande emissão da produção de biocombustível, por isso o Renovabio traz alguns critérios chamados de elegibilidade.

Entre os critérios de elegibilidade que vai assegurar a emissão de créditos de carbono, destaca-se a necessidade da matéria-prima vir de uma área regularizada. Quem quer entrar no programa deve estar regularizado no CAR. A produção da biomassa que vai virar biocombustível e gerar créditos de descabonização não pode suprimir vegetação nativa. “Você não pode querer ganhar um crédito de descarbonização numa área que acabou de desmatar. Isso é uma incoerência muito grande porque a maior emissão no caso de biocombustíveis está na origem do uso do solo”, disse Morandi, lembrando que no caso da cana, há ainda um terceiro critério de elegibilidade para que se entre no Programa, que é a exigência do zoneamento agroecológico que evita que se plante cana em áreas inadequadas ao plantio. “Esses três critérios é que asseguram que o processo de produção vai gerar, mais na frente, um indicativo de confiabilidade para que se que possa emitir um crédito de descarbonização, que será um ativo financeiro que será comercializado no mercado”, explicou Marcelo.

De acordo com a Dra. Nilza, o Renovabio é um programa voluntário, com a menor participação possível do estado, que incentiva a sociedade a tomar parte de um processo que interessa ao mundo todo, que vai reconhecer o desempenho destas empresas que vão procurar esse crédito, levando a uma maior eficiência. Mas, para participar do Programa é preciso passar por algumas etapas. A primeira é fazer um contrato de certificação de biocombustíveis entre a firma inspetora que vai fazer a auditoria e a usina produtora do biocombustível, segundo essa firma inspetora vai fazer um projeto e explicar como serão os processos a ANP e depois fazer as auditorias in loco, com base em amostragens, e depois das auditorias esses dados serão colocados em consulta pública. “Os dados que estão no Renovacalc serão públicos para que a sociedade possa verificar que aquela nota não é fraudada.”, disse a representante da Embrapa, lembrando que há várias planilhas que a empresa deverá preencher. Ainda segundo ela, quem vai receber a certificação é a usina, assim como quem vai apresentar todos os dados, já que é ela quem vai ter que contratar o Programa. Entre os dados que terão que ser apresentados, estão a área queimada, qual o consumo de calcário e gesso, quais os fertilizantes usados, combustível utilizado, etc.

O presidente da Asplan, José Inácio, que abriu o encontro, reforçou a importância da organização dos produtores para fins de se adequar às exigências do Programa. “O Renovabio veio para ficar. É um programa que vai estimular a produção de biocombustíveis e melhorar o mercado e embora não sejamos indústria, somos parte importante deste processo porque disponibilizamos a matéria-prima que será processada, portanto, quanto mais organizado estiver o mercado, melhor para toda a cadeia produtiva e o Renovabio vem para melhorar essa organização, inclusive, com uma remuneração extra que são os créditos de descarbonização, além da própria contribuição ao meio ambiente”, disse José Inácio.

O dirigente da Asplan lembrou que na Paraíba, 45% de toda a cana processada é oriunda de produtores e os 54% restantes são de cana própria de usinas. Segundo José Inácio, ainda não se sabe de que forma os produtores serão beneficiados com esses cálculos de Notas de Eficiência Energético-Ambiental por meio da RenovaCalc. “Está tudo no início, mas, como nós estamos inseridos nesta cadeia produtiva, inevitavelmente, devemos ter nossa parcela de ganho calculada também”, finalizou ele. O diretor executivo do Sindalcool, Edmundo Barbosa, também participou do evento.

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